terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

A Joaninha Verde da Avenida Beira Mar


Apertando sem querer o botão automático
ela, de repente,
embarca no meu lado
aproveitando a artéria entupida do trânsito.

Ela desfila
explorando a transparência do vidro
e face negra enrugada do interior do automóvel,
tudo como se fosse a superfície lunar.

No vento artificial do ar condicionado
ela flutua com suas asas
sem gravidade,
uma astronauta verde com bolinhas amarelas
viajando pela galáxia plástica e estofada.

Enquanto eu estou parado,
ela explora todas as possibilidades.
Enquanto eu em minha inércia
mastigo o cotidiano pesado,
ela viaja pelo tempo,
poucos metros
são mundos distantes.

Algumas horas passadas
consigo completar mais um dia cansativo;
chego a minha casa,
minhas narinas
lentamente vão se libertando do cheiro de surdina.

Abro a porta,
exausto,
a Joaninha Verde da Avenida Beira Mar
mergulha novamente no ar quente e leve,
suas anteninhas, por um momento,
fitam-me,
parecem zombar da minha existência “humana”.

Voa sem formalidade
sumindo entre as folhas verdes de um pequeno brejal,
ela também está de volta em casa.

Poema:Rodrigo V. Souza
Imagem: Internet 

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O copo era de vinho



A lua nua invade a noite
roçando no véu das nuvens passantes.
Cadelas no cio
regendo a sinfonia da madrugada,
cachorros uivantes,
vira-latas em uma orgia de pau, pelos, vagina e luz.

Um caco de vidro aranha o pálido piso bege
respingado de orgasmo seco.
Um inseto invertebrado mergulha dentro do copo,
quebrando o silêncio da superfície inerte;
suas asas,
seu corpo minúsculo
banhado de cor cereja.
Mas quem embriaga hoje
não é a fermentação prolongada,
não é a essência da alfazema concentrada,
são as estrelas que brilham tímidas,
o tímido cheiro de teu cabelo
que insiste no travesseiro.

Um inseto invertebrado mergulhou dentro do copo
quebrando o silêncio da superfície inerte,
sorrindo,
ele respirou o último gosto de vida;

o copo era de vinho.

Poema: Rodrigo Vargas Souza
Imagem: Internet

O rio com sapatos

Arte: Andre Soares